domingo, 28 de abril de 2013

Regra (de) Três


Não se espante, caro leitor, mas, na época do colégio Salesiano, uma das matérias que eu mais gostava era matemática! Com certeza, a explicação para essa preferência foi a presença de mestres excepcionais, como Augusto e Helder. Gostava tanto dos números, que a minha primeira experiência, como professor, foi ensinando regra de três, cálculo do “x” da questão, etc. etc. para os meus colegas de turma. Isso mesmo: ensinava e aprendia ao mesmo tempo! Guimarães Rosa foi esperto ao perceber que professor é aquele de repente, aprende...
Sim! Não se espante mais uma vez pelo fato de eu ter escolhido medicina ao invés de engenharia...  Ora, até os filósofos gostam de matemática: “Só poderá entrar quem for um geômetra!”, não eram os dizeres da placa, na entrada da escola de Atenas?!  Pois é, para os gregos, Deus era um matemático! Por isso, Einstein acertou ao afirmar que Ele não joga dados...
Pois bem! Mesmo gostando de matemática, tem um cálculo que eu não consigo fazer... Já procurei a resposta de várias maneiras, mas não consigo chegar a nenhum resultado. Qual o cálculo?! Quer saber, mesmo?! É simples, mas é complexo: quantas vezes devemos perdoar?! Cristo até tentou dizer a resposta: 70 x 7! No entanto, quando estava no momento da sua morte, entre o ingrato e o ladrão, olhando para esse último, ele disse: “Em verdade te digo, hoje estarás comigo no paraíso!”.
Veja que ele não disse: “hoje, vocês estarão comigo no paraíso”. O verbo ficou mesmo no singular. O ladrão, Cristo perdoou, mas o ingrato... Oh! Coisa difícil é perdoá-lo! Por que a ingratidão é sem dúvida o pior de todos os pecados. Shakespeare abominava tanto a ingratidão que ele não se cansava de dizer: “Não é um ano, nem em dois, que se conhece um homem. Tudo que eles são é estômago, e nós não passamos de comida. Eles nos comem com sofreguidão e, quando se sentem empanturrados, eles nos arrotam!”.
Padre Antônio Vieira colocava esse defeito de caráter como uma das armas mais poderosas para destruir o amor; maior até do que o tempo e a distância.
Portanto, não se espante, caro leitor, com a “Regra três” de Vinícius de Morais: “Tantas você fez, que ela cansou, por que você rapaz, abusou da regra três, onde menos vale mais... Da primeira vez ela chorou mas resolveu ficar/ É que momentos felizes tinham deixado raízes no seu penar. Depois perdeu a esperança/ por que o PERDÃO também CANSA de perdoar!”.
E perder a esperança, meu caro, significa: acabou! Afinal, a fila tem que andar, não é mesmo? Até porque, muitas vezes, querendo ressuscitar uma convivência que já morreu há anos, estamos esquecendo, perigosamente, a grande lição de Zeus ao seu neto Asclépio: “Ressuscitar mortos não é coisa para os médicos. A ciência tem limites! Ressuscitar mortos é coisa dos deuses!”. E eu acho que somente Ele, e ninguém mais do que Ele, para perdoar eternamente!
Nós, mortais de carne e osso, com um coração que sangra a cada ingratidão, indiferença, humilhação, etc. etc. é impossível não cansar, ao chegar ao número cabalístico de setenta vezes sete... Na verdade, nossa vontade, além de não perdoar, é de revidar a cada agressão, a cada ingratidão... Gostaríamos até de nos tornarmos também porcos-espinhos e ferir com a mesma moeda o ingrato. Mas como um pinto (Edilson Pinto) poderá virar um porco?! Ainda mais um porco-espinho?! Será que torcendo pelo time do Palestra Itália, o Palmeiras, conseguirei?!
Não! Estou fora! Transformar o meu coração em pedra?! Jamais! E porco espinho não combina comigo. Até por que, sei muito bem o que Nietzsche quis dizer quando nos alertou: “Aquele que luta com monstros deveria tomar cuidado para não se tornar um deles!”. O melhor é aceitar tudo calado. O silêncio é o melhor remédio. Só não sei se o silêncio seria um perdão... Dizem que quem cala consente! Mas, também, do que adiantaria o meu perdão, se você nunca conseguirá perdoar o que você fez a si mesmo?
P.S. Dedico este artigo ao colega médico Henrique Santos, afinal foi ele que deu o mote: “Amigo, escreva pensando na bossa nova!”.

Francisco Edilson Leite Pinto Junior– professor, médico e escritor.

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