domingo, 6 de outubro de 2013

MONARK PEPITA


Fernando Lins
Músico e professor

Há coisas que nós não esquecemos, quando menos se espera, lá vem aquela recordação de dentro dos mais profundos alfarrábios da mente, muitas vezes sem ter nem porque, apenas você lembra-se de algo e começa a recordar de detalhes.
Pode ser uma música, um perfume ou um brinquedo, aí vem atrelado á recordação fatos paralelos que marcaram aquele tempo, você passa alguns minutos com o olhar fixo em um ponto qualquer e deixa o pensamento viajar, tentando retroceder a fita da vida e ver alguns flashes do passado.
No meu aniversário de sete anos, quando eu morava em Santos Reis, ganhei de presente dos meus pais uma bicicleta Monark Pepita, era branca com detalhes azuis e o símbolo da Monark com detalhes dourados, apesar de pequena, pois era apropriada para o meu tamanho, era muito robusta e meu pai Antônio, vez ou outra, mesmo com seus 75 quilos, fazia uma fita, dava umas voltas pelo quarteirão e soltava seu lado menino e extrovertido, que foi sua característica até sua precoce partida.
Eu acordei pela manhã e lá estava ao lado da minha cama a bicicleta novinha estalando, poucas vezes na vida senti tanta emoção, a alegria invadiu meu coração, a primeira atitude foi levar a bicicleta para a rua que era de areia e junto com meu pai ensaiar as primeiras pedaladas.
Na época em que mundo fervia com a Primavera de Praga, mulheres francesas queimando sutiãs em praça pública, guerra do Vietnã, assassinato do Prêmio Nobel da Paz Martin Luther king, morte do cosmonauta Yuri Gagarin, do piloto da F1 Jim Clark, quando Dr. Zerbini fez o primeiro transplante de coração aqui no Brasil.
 1968 ano que não terminou; o grande marco da contracultura, a pleno vapor e em um bairro pacato e praiano de uma pequena cidade, um menino com sua bicicleta a pedalar, embalado pela canção Alegria, Alegria, do Caetano que naquele mesmo ano no dia 1° de maio lançou o Movimento Tropicália.

Nesse mesmo dia Abreu Sodré governador de São Paulo é apedrejado em palanque na praça da Sé por trabalhadores contra a Ditadura Militar.
No Recife a casa de Dom Hélder Câmara é metralhada e em meio a visita da rainha Elizabeth ao Brasil o famigerado AI5 é editado pelo Congresso e sancionado pelo presidente Costa e Silva.
Aos 13 dias de outubro, o poeta Manuel bandeira deixa a nossa terra e vai de vez embora pra Pasárgada.
Richard Nixon é eleito presidente dos U.E.A.
Carlos Lacerda é preso no Rio de janeiro e tem seus direitos políticos cassados por dez anos.
Poderia me estender mais sobre esse e outros anos de chumbo, mas prefiro voltar para minha singela Santos Reis com suas areias brancas seu cheiro de maresia, sua claridade ofuscante, e meu pai e minha mãe no alpendre do sobrado a me ver pedalar minha Monark Pepita em perfeita harmonia com a natureza.

Nenhum comentário:

Postar um comentário