Por Leonardo Sodré
Jornalista e escritor
Jornalista e escritor
Sem nenhum sucesso em conseguir agradar plenamente a mulher que amo, sou, entretanto, um observador das cenas urbanas, praiana etc. Quando escrevo ‘plenamente’ tento dizer que nunca acertei em agradar no quesito máximo, ou seja, cem por cento. Da mesma forma, também não sinto agradado ‘plenamente’ e isso serve para os dois, cuja via de relação é de duas mãos.
Afora meus rompantes por nunca ter tido a frieza de controlar os sentimentos, procuro compreender e entender a forma dela ser; seus melindres, suas aspirações, manias, cacoetes etc. Ela também me vê da mesma forma. Sou absolutamente adepto da pontualidade e não me incomodo nem um pouco quando ela pergunta:
- Que horas você vem? Por exemplo.
Mas, se eu fizer uma pergunta dessas o Céu escurece, o mundo treme de medo e a resposta já está na ‘ponta da língua’, em tom nada amistoso:
- Vou quando der! Sou muito ocupada! Responde.
Mas, garanto e me ressinto: este tipo de resposta está reservada apenas para mim. Para outros, menos chegados, a resposta é suave. Estou dando apenas um exemplo. Ela provavelmente tem muito mais para dar de mim guardado no alforje de seus ressentimentos. É natural. E o que pode unir pessoas às vezes tão diferentes? Somente o amor?
Acho que não. Na História da relação contamos com uma situação de cumplicidade tão forte que faz com que, aos poucos, as diferenças sejam aplacadas, porque jamais serão sanadas. Não é toa que muita gente diz que quando se troca de parceiro a mudança está apenas no CPF, porque não existem pessoas perfeitas, que se encaixem direitinho no jeito que queremos que elas sejam.
A escritora britânica Taylor Caldwell, autora de ‘Médico de Homens e de Almas’, sobre a vida do apóstolo Lucas e do ‘Grande Amigo de Deus’, sobre a vida de São Paulo, diz no último livro que Paulo, que também era um fabricante de tendas, desejaria ter passado a vida as fabricando ao invés de exercitar tanto a mente e a oração para divulgar a ‘Boa Nova’ de Jesus Cristo. Paulo discursa, exortava e escrevia muito. Será que por isso ele era tão irascível, como comprovam seus biógrafos?
Observo que pessoas ligadas às artes e ao pensamento às vezes são bem mais diferentes das pessoas comuns. Será que se eu não escrevesse livros, reportagens, pintasse quadros e não tomasse nem uma dose de rum; talvez sendo um fabricante de tendas, eu agradasse mais o meu amor?
Desconfio que sim. Vejo nas pessoas ligadas as artes um semblante de inquietação. Eu sou inquieto, mordaz e, às vezes, ferino nas observações. Assumo como defeitos incontroláveis.
Entrementes quando o amor explode dentro do coração aceitamos incontinente nosso parceiro ou parceira com tanta alegria e entusiasmo que não percebemos que estamos dizendo ‘sim’ ao seu jeito de ser, de viver. Aos seus vícios seus murmúrios. Quando a fumaça da paixão se esvai e o amor amadurece, constroem-se castelos, formam-se vidas simbióticas. Nada é somente mais de um. Depois, como por mágica um ou outra acolá ou ali, resolve que o ‘outro’ tem que se adequar ao jeito desejado de um ou de outro. Chega a amargura... C’est La Vie.
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