(publiojose@gmail.com)
Há pouco conhecimento sobre estudos que determinem o tempo que o brasileiro passa nas filas. Porém, com estudo ou sem estudo, reconheçamos ser um tempo respeitável. No Brasil, atualmente, poucas instituições têm vida mais alicerçada e duração mais firme do que as filas. Sobe o dólar, desce o dólar – e as filas estão lá; sobe a inflação, desce a inflação – e as filas estão lá; estoura mais um escândalo com Sarney, o escândalo passa (normalmente em mais um lance de puro fisiologismo político e indisfarçável vassalagem da Justiça) – e as filas estão lá; cai ministro, sobe ministro – e as filas nem aí. Duradouras, inamovíveis, eternas. A existência das filas em nossas vidas transformou-se num fato tão palpável quanto o ar que respiramos ou quanto os (incontáveis) impostos que pagamos. Aliás, de tão presentes, transformaram o Brasil no país das filas, prova do poder que adquiriram ao longo do tempo.
No Brasil tem fila pra tudo. Umas mais desrespeitosas do que outras; umas mais massacrantes do que outras; umas mais humilhantes do que outras; todas, porém, com um traço comum: o desprezo permanente pelo outro. Pois a fila nada mais é do que um instrumento institucionalizado de demonstração de poder de um segmento em relação a outro, da imposição do querer de alguém sobre a necessidade do outro. Alguém poderá argumentar que a fila é uma ferramenta democrática uma vez que todos (ou quase todos) a elas se submetem. Esse argumento pode até alcançar algum fundo de verdade, mas não esconde o fato de que a fila é uma prova da falta de estrutura do prestador de serviço diante de uma demanda muito superior à sua capacidade de atendimento. Ou seja: clientelas cultivadas em demasia tendo em contrapartida, além de equipes despreparadas, logísticas de diminutas dimensões.
Quantificar a demanda honestamente seria o mais indicado. Mas, qual o segmento empresarial ou estatal que age assim, se do outro lado do balcão está um consumidor inerte, omisso em relação aos seus direitos e passivo diante de quadro tão humilhante? Tais demandas, incentivadas e estimuladas por fortes campanhas de marketing, criam um descompasso tão grande entre a estrutura de atendimento e a clientela presente que qualquer solução se mostra improvável. Enquanto isso, a fila vai massacrando, desrespeitando, humilhando... E se perpetuando. Uma das provas mais robustas do poder da fila reside nas instituições bancárias. Ah, os bancos! De casas maravilhosas nos comerciais de tv e anúncios de revistas passam a vilões de primeira linha quando a questão está relacionada ao atendimento que oferecem – e às filas quilométricas que impõem diariamente ao correntista e ao pobre do usuário.
Em se tratando de Brasil, fica realmente difícil diagnosticar qual o banco proprietário da fila mais robusta, mais emblemática desse vexame coletivo. Leis, normas, portarias, acordos, tudo já foi tentado e os bancos nem, nem. Inicialmente tido como cliente, como usuário, como necessitado de serviços bancários, o brasileiro passou à condição de suplicante, tamanha a diferença entre um status e outro, tamanho o desprezo que os bancos direcionam a quem se coloca diante de seus guichês. Era de se esperar, diante dos lucros estratosféricos que amealham – cantados em prosa e verso como demonstração de excelência empresarial – que os bancos cogitassem um maior compromisso com o atendimento à população. Ledo engano. Entra ano e sai ano e as filas só crescem. Os lucros se agigantam, o portfólio se expande, porém a fila continua lá – impávida, fria, impessoal, vomitando sua presença na cara de todos.
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