Francisco Edilson Leite Pinto Junior
Professor, médico e escritor.
É óbvio que cada um enxerga com os olhos que têm e a partir de onde os pés pisam. Por ser leitor do Poeta Manoel de Barros também acredito que a melhor forma de se conhecer é fazendo o contrário. Talvez, seja por isso mesmo que muitas vezes sou do contra...
Pois bem! Steve Jobs, antes de morrer, disse que a morte é a maior invenção da vida. Discordo! A maior invenção da vida é mesmo o homem. Com as 75 trilhões de células e um número exorbitante de átomos, o homem é sem dúvida a maior invenção de todos os tempos. Não há ipad, iphone, computador de última geração, nem as mil e uma utilidades do Bombril... Nada, absolutamente nada, que o suplante. E o mais interessante é que Deus - mesmo com toda a sua onisciência, onipotência e onipresença-, ao criá-lo, precisou colocá-lo no mundo, para saber se ele funcionava.
Sim, meu caro leitor, não tenha dúvida que estamos neste planeta terra para sermos testados, através de provas e expiações. E que me perdoem os órgãos fomentadores de pesquisa, e me permitam dizer que Deus é um grande pesquisador. E mesmo não submetendo a sua obra ao CEP (Comitê de Ética em Pesquisa); não sendo doutor; nem tendo feito teste de proficiência e só tendo uma publicação, que nem era em inglês, mas sim em hebraico... Deus é sim um grande pesquisador.
E no Jardim do Éden, ao alertar-nos dos perigos de comer o fruto proibido, estava Ele iniciando a sua pesquisa: saber quantos anos levarão os homens para compreenderem que o seu destino é amar... Agora entendo por que Drummond tanto se perguntava: “Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar? Amar e esquecer, amar e malamar, amar, desamar, amar? Sempre, e até de olhos vidrados, amar?”.
Riobaldo, o maior personagem de Guimarães Rosa, sabiamente desconfiava que também fazia parte desta pesquisa: “Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - mas que elas vão sempre mudando”.
Mudando! Mas nem tanto... Ora afinando, ora desafinando. Assim caminha a humanidade. E o mais interessante é que mesmo fazendo o seu Recall (afinal, se a teoria de Allan Kardec tiver mesmo fundamento, a reencarnação nada mais é do que uma forma de tentar reparar os nossos defeitos), o homem continua, vire e mexe, tendo atitudes medíocres.
Inveja, ambição, ingratidão, avareza, ira, gula, soberba etc. etc., tudo isso fazem parte dos nossos defeitos de fábrica... Pois é, caro leitor, a pressa é mesmo inimiga da perfeição. Conta uma lenda que Deus, querendo povoar rapidamente a terra, começou a fabricar corpos a semelhança de manequins, mas quando chegou à caixa craniana, de muitos exemplares, esqueceu-se de preenchê-la com o amalgama das boas aptidões. Por isso, que é rotineiro, pela falta de miolo, muitos terem o cérebro como um porta-joias vazio... Quem quiser saber mais dessa lenda, leia o livro “O homem medíocre”, do médico argentino José Ingenieros.
Homem medíocre; homem primata. Homem que é a única espécie do mundo que não quer ser ele mesmo. O cachorro que ser cachorro; o gato que ser gato; o pinto que ser pinto, mas o homem não que ser ele mesmo.
E ao querer ser o outro (“Que coisa triste não sabermos o endereço de nossa alma”), começa a ter o mais abominável, de todos os sete pecados capitais, que é a inveja. Sentimento mesquinho de não querer que o outro passe bem. De sempre pensar que o jardim do vizinho é melhor do que o dele; E isso causa uma tristeza infinita, afinal já dizia Napoleão Bonaparte: “A inveja é uma declaração de inferioridade!”. O invejoso é tão medíocre, e pequeno, que chega ao ponto de contar o número de citações de um texto só para ter o prazer de dizer: “Você não é escritor, mas sim um ladrão de frases!”. Coitado, na sua má fé cínica, o medíocre invejoso desconhece o que vem a ser a intertextualidade...
Se o homem invejoso é pobre de espírito, mais paupérrimo ainda é o ganancioso e ambicioso, pois vive como Tânatos: sedento e faminto eternamente. Nada o sacia. Sempre querendo mais e mais. Vive correndo atrás de bens materiais e quanto mais tem, mais quer... Coitado! Desconhece – na sua obtusidade de córnea-, que rico é aquele que se contenta com o que tem.
Portanto, na sua santa ignorância, o matuto Riobaldo tinha razão: “O diabo não há! É o que eu digo, se for... existe é homem humano!”. Homens que colocam a justiça no banco dos réus; homens que jogam a política na sarjeta; homens que não se importam que os seus semelhantes estejam morrendo, nos corredores dos hospitais públicos desse país... Homens, demasiados e belamente humanos!
E será, caro leitor, que só há um jeito de consertá-los: o recall? Será que nesta vida atual, não há uma forma de tentar repará-los, ajustá-los, encher os seus “porta-joias” com mais bondade? Claro que há. E aí o Steve Jobs tem razão: a morte é uma grande invenção. A segunda é claro, depois do homem, mas é uma grande invenção.
Sólon, um dos maiores jurista grego, sentenciava que só depois da “morte” é que o homem poderia ser feliz. E aqui, abro um parêntese para dizer que não precisamos desaparecer fisicamente para morrer. Quando dominamos a nossa ambição, quando nos libertarmos da nossa inveja, quando temos consciência da nossa finitude, aí fica fácil de perguntar: “Pra que toda essa luta pelo poder, se daqui a cem anos, caro leitor, nem eu nem você estaremos mais aqui?“.
Amanhã, completarei 46 anos. Segundo Rubem Alves, estarei me desfazendo desse tempo. E a cada novo amanhecer, confesso que agradeço a Deus a vida que tenho; a família a que pertenço; a profissão que abracei. Agradeço frequentar semanalmente uma grande escola de vida, o Hospital do câncer Dr. Luiz Antônio, pois é ali, na convivência diária com a morte que eu aprendo que a única coisa que vale a pena lutar, com unhas e dentes, é pelo AMOR. Pois só através dele é que poderemos preencher a eternidade...
Nenhum comentário:
Postar um comentário