quarta-feira, 31 de março de 2010

Ponte de Igapó

CEM ANOS DA MELHOR ENGENHARIA NO NOSSO POTENGY RIVER

Manoel Fernandes de Negreiros Neto
Engenheiro Civil
E-mail: mnegreiros@natal.digi.com.br

Potengy river, era assim que o engenheiro projetista da ponte em treliça metálica ferroviária chamava o nosso velho rio Potengi em 1912, quando os trabalhos começaram. A ponte metálica em 1900 era o símbolo maior da Revolução Industrial em todo o mundo. A engenharia e a construtora eram da Inglaterra, o projetista era frances, e a ponte que passou a ser nossa depois de alguns anos está lá até hoje.

Georges Camille Imbault (1877-1951), nascido na cidade de Châteaunef-sur-Loire, na beira do rio Loire a sul de Paris foi o projetista responsável por essa ponte. Estava a serviço da “Cleveland Bridge Engineering and Co”, fundada em 1877, que foi a construtora escolhida pela proprietária da linha, a “Great Western of Brazil Railway Company Limited”, que até hoje é baseada em Da rlington, condado de Durham, a 277 km ao norte de Londres. Em seu currículo de pontes metálicas já havia a Victoria Falls Bridge em 1905 no Zimbabue, África e na Newport Transporter Bridge 1906, onde atuou como engenheiro residente. Como engenheiro responsável tinha a Atbara Railroad Bridge em 1911, com 336 metros no Sudão, a Blue Nile Bridge, com 560 metros no Sudão em 1909. Tudo isso antes de ser o responsável pela nossa. E é que ainda brilhou muito pela frente, principalmente como engenheiro consultor na “Sidney Harbour Bridge” com um único vão de 503 metros! Quem passa pelo térreo do Shopping Midway Mall próximo a loja da Miami Imports e as escadas vê um grande pôster dessa ponte em Sidney.

Alguns relatores se referiram à ponte metálica do nosso Potengi como pré-fabricada vinda do atual Reino Unido (UK). Mas quem vai lá observar os detalhes de engenharia facilmente se impressiona, eu particularmente, me emociono todas as vezes que vou lá. A riqueza de detalhes de encaixes das várias formas d e perfis, os rebites de 3/4”ou 7/8” que tinham de ser colocados a quente e depois batidos. As inúmeras cantoneiras de reforço. Os tirantes e os braços de compressão. Os arcos dos topos da treliça, que são volumétricos e formados por quatro chapas rebitadas. Os apoios articulados e fixos numa extremidade, articulados e móveis na outra extremidade do vão, formando uma estrutura perfeitamente isostática e pronta para as cargas dinâmicas dos trens carregados em velocidade e para a dilatação no sol de Natal, pois os apoios móveis são sobre dois roletes de aço para cada viga em todos os vão. E todo o conjunto vem da simplicidade do Método dos Nós ou Método de Cremona ou, ainda, do Método de Ritter ou Método das Seções.

Todos nós sabemos que a nossa velha ponte têm nove vãos de 50 metros e um, não tão central como falam de 70 metros, que fica mais à margem esquerda do rio.

Obtive nos arquivos vários decretos e contratos referentes. Mas esse me chamou a atenção, era o decreto No 10.917 de 27 de maio de 191 4 que autorizava a substituição de um dos vãos centrais por outro de 70 metros e assim alterava o Decreto N o 8.372 de 11 de novembro do projeto aprovado em 1910, sem alteração do orçamento! Olha que beleza conseguiram os fiscais da época! Mas ficou na minha cabeça o porquê dessa substituição. Foi quando em pesquisas pelo DER/RN, com a gentileza do Sr. Canindé obtive a batimetria e perfil completo da seção onde seria realizada a segunda ponte finalizada em 1970 e percebi que exatamente no trecho do vão de 7 0 metros o rio se aprofunda bastante o que tornaria quase inexeqüível uma execução de fundação bem nesse canal profundo. Assim optou-se por aumentar o vão e apoiar as fundações, agora desvendadas, nos bancos anteriores a esse canal.

Não houve como me desvencilhar dessa história de engenharia civil. Em 1996, quando, após conseguir um contrato de construção de alguns galpões para o grupo Guararapes em Extremoz, passei a trafegar diariamente ao lado dessa maravilha tecnológica ali, nas minhas barbas e beirando os cem anos. Intacta por si só, apenas mexida por alguns não amantes de uma velha e boa engenharia.

Os blocos de apoios das vigas, os chamados “concrete abutments”, provavelmente executados pelo sistema de “pneumatic caissons” estão perfeitos até hoje! Essas informações de caixões ou campânulas pneumáticos me foram passadas pelo geólogo Edgard Dantas que em conversa com “mestre Gaag”, um austríaco que se radicou por aqui e participou da construção da estátua do Cristo Redentor no Rio, foi informado dessa tecnologia utilizada na nossa ponte.

Depois de mais de quinhentas fotos de detalhes de todos os tipos, mas não todos, ainda, veio à pergunta: e as fundações?

Em mesa redonda concordamos que eram de estacas batidas por bate-estacas a vapor ou na mão mesmo. Só faltava descobrir se eram de concreto armado, metálicas - o mais provável - ou de madeiras. Então na quinta-feira dia 11 de março de 2010, partimos eu e o engenheiro Fabio Pereira do Iate Clube, no barco da Mar & Sub, numa cortesia do comandante Afonso Mello, em direção as velhas e enigmáticas fundações. A maré era a alta e deveria estar no seu pico, sem correnteza. E assim estava. Passei todas as instruções de cuidados e segurança para o mergulhador Marcos, enquanto outro marinheiro me passava os dados da ecosonda informando as profundidades à medida que navegávamos em frente aos blocos. O Marcos mergulhou empunhando uma Canon subaquática no bloco de número seis a contar da margem direita do rio. A visibilidade era muito ruim. E qual não foi a grande surpresa nas primeiras informações do Marcos: não havia estaca nenhuma a vista. O bloco descia alargando-se numa forma escalonada até chegar ao leito do rio. Somente com o próximo ensaio de “Pile Integrity Test – PIT” é saberemos se há e quais estacas após a base desse bloco.

Essas informações vieram corroborar com as minhas intenções de escrever um livro – hoje conto com uma quantidade grande de artigos e livros técnicos velhos, ingleses e franceses da época - sobre tão empolgante história de construção numa época em que só havia os barcos a vapor, o “steam engine” aperfeiçoado por James Watt (1736 - 1819). Os filmes eram quase todos mudos e de Charles Chaplin. Dentre os automóveis dominantes existia o Ford modelo T. Natal em 1913 acabara de receber os serviços de energia e luz elétrica nas ruas. O jornal principal da época o “A República” informou a data da chegada do vapor “Artist” trazendo o maquinário da “Cleveland Bridge” sendo recebidos pelos engenheiros Stephen e Beit e que as obras ficariam a cargo do engenheiro residente F. Collier. Que “maquinário” era esse?

Mantive um contato e obtive a informação por intermédio do neto, Antonio Modrach Lira, que o alemão Alfred Modrach que era engenheiro de ferrovias e trabalhava no Piauí também foi chamado para trabalhar para a “Great Western” ou “Cleveland Bridge” e atuou na ponte. O filho de Alfred, Ulisses Modrach, um garoto de quase cem anos que mora no Rio de Janeiro e seus parentes prometeram enriquecer essa história.

O objetivo dessa história é conhecer e recalcular todos os elementos construtivos utilizando a tecnologia da época, a de hoje só valerá para confirmações. Identificar todas as técnicas utilizadas e correlacionar essas técnicas com a durabilidade de obras hoje. A pergunta que não quer calar é porque essas obras duraram tanto sem nenhuma manutenção, muito pelo contrário, tentaram desmanchar – foi vendida para um ferro velho – e não conseguiram. Será que existem alguns carros rodando hoje com a lataria proveniente das belas peças de nossa ponte?

Será que a tecnologia da fornecedora do aço da nossa Potengy river, a “Dorman Long” em Middlesbrough próximo a Darlington idem, a mesma que forneceu o aço para a hoje, ainda majestosa “Sidney Harbour Bridge” na Austrália, existe? Porque nossos aços CA 50 e CA 60 são tão suscetíveis à corrosão quando inseridos no concreto, não resistem à mínima presença dos cloretos? Que cimento foi aquele usado? Era apenas o início da fabricação industrial do cimento. Será que veio da Inglaterra mesmo, ou veio da França, mais precisamente do grande fabricante Luis Vicat, o da “agulha de Vicat” que determina o início da “pega” do cimento? Qual a relação água/cimento utilizada? O concreto foi virado na mão, ou nas amigas “betonieres” a vapor?

2 comentários:

  1. Interessante a história!
    Parabéns!

    Daniel Modrach

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  2. muito bom me intereça bastante sabr sobre nossa velha ponte so não entend ainda pra ke era akeles ferros ao lado??

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