Jornalista
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Os primos iam chegando do interior, na carona de algum doente, ou então para passar as férias “na cidade grande”. A minha excitação era enorme por querer mostrar “aos do mato” as coisas da capital. Era um tempo bom. Nossa casa vivia cheia de novidades, servindo de posto de serviço para parentes e amigos vindos de longe, na busca da solução dos seus problemas. Gente transitando diariamente da sala para a cozinha Eu, cheio de superioridade, ansioso por mostrar as últimas novidades, o que estava moda. Lembro-me que entre as coisas mais modernas e que eu fazia questão de mostrar, de fazer os meus amigos conhecer o mais rápido possível era o trem. Ah, o trem. Seus mistérios, seu charme, sua presença forte, seu apito piuíííííííííííííií tomando conta de nosso dia-a-dia. O encantamento que me ocorria quando ia receber meu avô na estação. Ele chegando de Baixa Verde pelo trem.
Eu, cheio de graça, de alegria, na grande expectativa de pisar o saguão iluminado e amplo da estação ferroviária. De repente o trem saiu de cena. “O Milagre Brasileiro” dos anos 70 fizera o Brasil tomar outro rumo. A prioridade total agora era o mundo trepidante do automóvel. O Fusca, o Corcel, o Opala, o ônibus, o caminhão tomaram as ruas e estradas do Brasil, ceifando, de nossas lembranças, a presença marcante do trem. Piuíííííííííí. Para nós, crianças nascidas e crescidas embaladas pelo seu resfolegar robusto e o estremecer do chão sob nossos pés, o trem era muito mais do que motivo de simples brincadeiras. Estudantes em férias, comadres chegando para a visita, a festa da padroeira, mercadorias chegando, embarcando...... Tudo isso foi levado pela fumaça do tempo e pelo privilégio dado pelo Governo à indústria automobilística. Ah, mais eis que um dia as esperanças estão de volta.
O trem estatal, atrasado, lerdo, arcaico, prejudicial às finanças públicas, de empregados despreparados, acomodados, protegidos por sindicatos corporativistas, esse trem – junto com outros paquidermes estatais como empresas de energia, bancos, telefônicas – vai sair de cena e dar lugar a outro trem. Um trem moderno, eficaz, rápido, de fazer inveja a trem de Primeiro Mundo. Até o FMI ia ficar maravilhado. Minha expectativa foi tamanha diante dessas notícias, que tive vontade de convocar os velhos companheiros de infância, tanto os da cidade como os do interior, para lhes contar a grande novidade: o trem, enfim, ia voltar ao seu trono! A privatização foi coroada de êxito. A voz do locutor do Jornal Nacional nos emociona. Agora o Brasil vai – e o trem também. Foi? Que nada. Passam-se os anos e nada acontece. Estações desertas, trilhos abandonados, empregados entregues à própria sorte, eis a realidade que ficou.
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