Leonardo Sodré*
Depois de um longo período como bancário do Banco do Brasil, finalmente Minervino iria realizar o sonho de sua vida, tornando-se um empresário. Resolveu montar uma granja de galinhas de raça puríssima, e depois de pesquisar na internet e consultar muitos especialistas, optou pela raça “Plymouth Rock Barrado”, que tinha a característica de ser totalmente xadrez e robusta.
Sonhava com os prêmios que iria ganhar nas exposições do setor em todo o país e começou a procurar uma área para montar sua granja, que teria que ser numa região tranquila para que as galinhas pudessem crescer em paz. Um lugar onde não houvesse grandes variações climáticas. E, depois de percorrer praticamente todo o Rio Grande do Norte, optou pela região de Touros, depois que descobriu ser um dos locais, no mundo, onde ocorria uma das menores variações de temperatura, que segundo seus estudos oscilavam anualmente menos de um grau centígrado.
Comprou uma pequena fazenda, fez as obras necessárias para adaptar as galinhas que estavam vindo da Inglaterra - cerca de quinhentas matrizes -, construiu uma casa, escritórios e passou a esperar o aviso do importador, para ir buscar as “bichinhas” no aeroporto.
Sem ter o que fazer, enquanto esperava a chegada das habitantes da “Fazenda Beatles Rock Barrado”, passava os dias tomando uísque e fazendo as contas de quantos pintos iria vender anualmente. Chegou a conclusão que se não houvesse nenhum inconveniente, como doenças, ficaria rico em poucos anos. Mas, estava contrariado com a demora. Amaldiçoou os entraves burocráticos de importações e quase se arrependeu de ter mandado buscá-las na Europa. Poderia ter comprado suas matrizes no Brasil, mas como era excessivamente desconfiado, queria ter certeza de ter adquirido um lote de sangue absolutamente puro.
Num domingo chegou o aviso do importador: as galinhas estavam no aeroporto aguardando que ele fosse buscar o quanto antes. Sem perda de tempo e tomando todos os cuidados necessários, trouxe-as para a fazenda, instalando-as, conforme tinha estudado, da melhor forma possível. “Pronto, – pensou – agora estou estabelecido. Tenho minha fazenda e minha criação.”
Passaram-se alguns meses e nada das galinhas colocarem um único ovo. Apesar do árduo trabalho que os felizes poucos galos estavam tendo, nada. Ele somente gastava com ração e a explicação dos técnicos que contratou era de que isso ocorria devido ao estresse da viagem, que durou muitas horas.
Minervino, nervoso, pesquisava profundamente sobre o assunto na internet. Tentou de tudo. Até colocou caixas de som nos galinheiros com músicas dos Beatles, mas nada deu resultado. “Um fracasso – pensava. O que vão dizer de mim, depois de toda essa trabalheira? Bem que disseram que eu fosse criar bode no Seridó”.
Um dia, quando ele menos esperava, todas começaram a colocar ovos. Centenas. Ele quase não acreditou. Ligou para os amigos, comemorou, fez festa e dormiu bem pela primeira vez em muitos meses.
Na manhã seguinte, ao raiar do dia, contente, saiu para apreciar sua criação. Quase morre, depois de verificar em todos os galinheiros, que todos os ovos haviam sido bicados pelas galinhas. Todos! Desolado voltou cabisbaixo para consultar novamente os técnicos no assunto. Depois de muitos telefonemas, descobriu que algumas galinhas, não se sabe por que, têm esse hábito. Mas logo as suas! E todas!
Como não tinha mais o que fazer, resolveu tomar “todas” num bar próximo. E, depois de alguns uísques e de comentar o seu infortúnio para alguns amigos, alguém sugeriu que as penosas fossem submetidas a um treinamento para pararem de bicar os ovos. O esperto sugeriu que ele conseguisse alguns ovos de ferro, pintasse de branco e colocasse no galinheiro. Garantia que depois de umas bicadas no ferro duro, as galinhas fatalmente deixariam de quebrar suas posturas. Minervino concordou:
-Tem sentido. Vou providenciar imediatamente alguns ovos de ferro. Elas vão aprender.
No outro dia, vai a Natal, diretamente para o bairro da Ribeira, onde existiam muitas lojas de ferragem. Entrando numa, de um velho conhecido comerciante, é cumprimentado por ele, que vem atendê-lo encurvado, apoiando-se numa bengala.
Minervino estava eufórico e sem dar muitas explicações ao seu velho conhecido, foi logo perguntando:
-O senhor tem ovos de ferro?
O velho coça o seu longo bigode, já acostumado com muitas perguntas e histórias impertinentes da velha Ribeira e responde com tranqüilidade:
-De jeito nenhum, meu filho. Eu ando encurvado assim devido a um velho problema de coluna...
*Jornalista e escritor
Jornalista, DRT 0985.
(Agosto de 2005)
(Agosto de 2005)
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