--- Walter Medeiros*
Glênio Sá era o dirigente maior do Partido no Rio Grande do Norte, e considerado um dos membros do partido mais preparados em todo o Brasil. Este fato era também do conhecimento de lideranças dos partidos convencionais, que demonstravam por ele um grande respeito e admiração. O ingresso de novos militantes, vindos do Movimento Estudantil e de movimentos sociais em bairros, fazia o crescimento da organização, ao ponto de decidirem alugar uma ampla sala que serviria de sede, em um prédio situado nas proximidades da casa de Glênio. Ali passaram a promover reuniões com o fim de preparar melhor as atividades.
Em meio às articulações políticas que fazia, o PC do B sentia a necessidade de ocupar espaços nas eleições. Foi assim que em 1984 resolveu participar da campanha apoiando a candidatura do então deputado Garibaldi Filho (PMDB) para prefeito da Capital. Era a primeira eleição direta para prefeito desde o início da ditadura. Até então, os prefeitos das capitais eram nomeados pelos governadores dos estados. O partido participou da campanha, devido a uma aproximação promovida por amigos, que tinham relacionamento profissional com a família do candidato. Garibaldi foi eleito.
Na campanha seguinte, o Partido decidiu lançar Glênio como candidato a Deputado Estadual, pelo PMDB. Era a seqüência de atividades que haviam-se iniciado com a realização de um considerável ato público no dia 11 de abril de 1985, no Teatro do bairro, pela Comissão pela legalidade do PC do B. O slogan divulgado na ocasião era: “O direito à liberdade não se mendiga, se conquista”. Em campanha ele sofreu um acidente de automóvel que o deixou imobilizado por várias semanas e sem mais condições de disputa naquele pleito.
Até 1985, aquelas atividades partidárias eram consideradas clandestinas. O envolvimento com as atividades socialistas faziam Glênio visado e prejudicavam qualquer tentativa de exercer atividade profissional regular, embora tenha tido por alguns meses um emprego na empresa de informática Sistema. Ele foi, entre 1984 e 1990, candidato sucessivamente a vereador, deputado estadual e senador, representando frentes de esquerda, o que somou experiências para o Partido obter mais adiante bons resultados eleitorais.
Em julho de 1990, uma notícia da televisão chocou a todos. Um acidente de automóvel tirou a vida de Glênio e do seu companheiro de viagem Alírio Guerra. Eles passavam pelo município de Jaçanã, quando o carro em que viajavam foi colidido de frente por outro que trafegava em sentido contrário cheio de pessoas embriagadas. A movimentação foi imensa, desde a chegada da notícia, o velório e o enterro, ao som da música “Canção da América”. E a imprensa destacou os dois, dando-lhes o título de “Caminhantes dos Sonhos”.
Na despedida os familiares e amigos destacavam que ficava a lembrança inapagável da sua presença física, que transmitia tanto amor, confiança, certeza, força, lealdade, dignidade, simplicidade, justiça, ânimo e pureza. Além de alistá-los entre os “imprescindíveis”.
Glênio morreu sem receber as reparações devidas pelo Estado, que fez da sua vida um período de desassossego e mazelas. Por causa das torturas sofridas nos cárceres da ditadura militar, vivia sobressaltado e demonstrava impaciência e incômodo, resultado do período em que teve de ficar confinado em ambientes impróprios para a permanência de qualquer ser humano.
Nesta sexta-feira, 23 de março de 2012, Glênio Sá recebe – in memorian – o honroso Título de Cidadão Natalense. Na sua simplicidade gigante, imagino seu discreto sorriso, ao tomar conhecimento da honraria a ele destinada por esta cidade, onde viveu tão intensamente sua vida, ceifada ainda na mocidade dos seus 40 anos. E diria mais uma vez frase que ressoou anos seguidos em seus lábios, nos dias, noites e madrugadas de militância: “Um por todos, todos por um!”.
*Jornalista
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