A sociedade tenta. Organiza-se, mobiliza-se, age. Monta entidades e ONGs voltadas para cidadania e política, para atrair o poder público para a discussão. Mas os políticos fogem do debate mais profundo. Mesmo quando estão, de fato, debatendo, como ontem, no encontro na TV Record. O Estado convidou quatro representantes de entidades da sociedade civil para assistir ao confronto e analisá-lo.
Seguindo mais ou menos o script usado em todos os debates até aqui, Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) se acusaram e, quando puderam, falaram de suas realizações prévias. Mas o diálogo foi pobre. 'É uma colcha de retalhos de temas, ninguém se aprofunda em nada', disse Mauricio Broinizi, historiador e coordenador executivo da Rede Nossa São Paulo.
Realmente, o debate atravessava assuntos diversos a cada dois minutos de fala dos presidenciáveis. 'Devia haver regra para que o candidato não saísse do assunto perguntado', sugeriu o publicitário Pablo Ribeiro, do site Eu Lembro. Talvez tanta divagação seja calculada e os candidatos queiram atingir um eleitorado específico. 'O discurso é para atingir a massa, mas fica até difícil diferenciar um e outro, é tudo muito confuso', avalia o consultor Rafael Lamardo, diretor do movimento Voto Aberto e do Extrato Parlamentar.
Para Caio Magri, sociólogo e gerente do Instituto Ethos, Dilma pecou em demorar a apresentar dados do governo Lula em comparação aos do governo FHC. 'É uma estratégia burra.' Broinizi e Magri lembraram que, nos primeiros debates pós-ditadura, quando 'raposas' como Leonel Brizola e Mário Covas participavam, os confrontos eram mais empolgantes. 'Claro que ali havia um espaço mais aberto para um projeto de futuro. Hoje, estamos engessados em modelos já definidos', ponderou Magri. 'Sem dúvida, o futuro era mais presente nos diálogos políticos', concordou Broinizi.
As regras engessadas dos encontros televisivos podem contribuir para esse tom insosso atual. 'O modelo parece esgotado. A plataforma para construir ideias e propostas, construir um diálogo político, é a internet', acredita Lamardo. 'O fraco debate na TV e no rádio é retrato da submissão da política ao marketing', explica Broinizi. Ribeiro complementa: 'Tanto que em todos os debates e em todos os programas os discursos são iguais'.
O balanço final dos convidados pelo Estado foi uníssono. Se, por um lado, os candidatos não se esforçam para aprofundar a discussão de temas relevantes para o País, por outro, o formato dos debates não estimula esse aprofundamento. 'Esse modelo é intragável e reflete uma legislação ultrapassada, em que os candidatos podem prometer o que quiserem sem ser cobrados por isso', disse Broinizi. 'Se, até 2002, os encontros na TV tinham algum peso, hoje não têm. Ajudaram somente Marina Silva e Plínio de Arruda Sampaio no primeiro turno, porque eles tinham pouco tempo de propaganda', conclui Magri.
Por Flávia Tavares, estadao.com.br
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