quinta-feira, 17 de junho de 2010

As ‘minhas’ castanholas

Sílvio Caldas
jsc-2@uol.com.br

Cascudo falou, Serejo falou, François falou. Agora, falo eu. Falo-ei (desculpem o trocadilho) não em nome da Botânica, ou da tradição cascudeana, ou do protesto serejeiro, ou da gozação silvestre dos últimos artigos de jornal. Refiro-me, isto sim, às duas castanholas que ornamentavam a frente da casinha dos meus pais, em Recife, às sombras das quais jogávamos bola de gude, Hélio e eu, e que à noite, por volta das 23 horas meu saudoso pai armava sua indefectível rede de dormir, não para dormir, mas para jogar conversa fora, descansando da faina diária de dez ou doze aulas que acabara de ministrar no colégio Salesiano.

Eu gostava mesmo era quando os vizinhos demoravam a chegar (mas findavam chegando), pois a conversa de meu pai era pra homem nenhum botar defeito. Quando eles demoravam minha conversa com ele era a dois. Tinha de tudo: história de Júlio César, Aníbal, Scipião Emiliano, Napoleão Bonaparte; ou então histórias antigas em torno de Lampião, ou da Revolução de 35. E a rede não parava, era um pra lá e pra cá, movida a um cacetinho que ele empunhava para produzir o embalo.

Na primavera as castanholas davam fruto. Um fruto de sabor duvidoso, mas que sempre quebrava o galho da molecada da Rua da Lama, que por lá passava de volta das aulas da Capela-Escola Santa Teresinha. Ao fruto denominavam coração de negro, ou coração da índia.

Um dia, meu pai de há muito falecido e eu já morando em Natal meu irmão Fernando decidiu cortar as árvores e cimentou a frente da casa. Eu só soube da notícia.

Concordo em parte com François Silvestre. Cascudo, quando não estava exercendo seu sábio magistério era sim, um gozador de primeira, graças a sua rara inteligência. Além do mais, misturava gozação com coisa séria, dado o seu modo filosófico de ser. Enfim, um gênio em tudo que se metia e se intrometia. Resta a nós, seus antigos discípulos ou admiradores procurar lembrar, por todos os meios, tudo o que nos deixou de história, estória, lenda, mito ou simplesmente folclore.

Agora, diante dessa confusão diante da castanhola cascudeana me liga o poeta Diógenes se dizendo com um problema.

- Sílvio, meu bichinho, estou com um problema.

- Só um? – respondo curto e grosso. Pelo que me consta você toma conta de uma árvore gorda, o baobá, há mais de vinte anos.

- Bem, existe uma velha mangueira que divide o terreno do meu escritório com o vizinho e eu acho que ela está bichada. Tenho medo que ela finde caindo e amassando nossos carros. Você acha que eu devo mandar cortá-la?

- Sei lá, doutor Diógenes, consulte as autoridades constituídas, ou seja, as autoridades ditas competentes, pois por mais incompetentes que elas possam vir a ser, só a elas cabe decidir se a mangueira pode ou não ser arrancada. Aproveite a época, pois se for obtida a autorização dará uma boa fogueira de São João. E me chame para os comes e bebes em torno da fogueira.

Esse Diógenes me sai com cada uma. Sei lá!

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