terça-feira, 4 de maio de 2010
POR DENTRO DA PELE
Simone Sodré
Médica e poeta
Numa estreita faixa tangente, ao pé da porta, ali estava pelo menos o corpo.
À sua volta o líquido havia evaporado e se juntado à poeira. O chão, então pegajoso, deixara pegadas.
Parecia que o momento fora impreciso. Mas, e essa porta entreaberta pela sua presença?
Inerte, já não poderia ser seu.
Ligou o som no mais baixo volume. Olhou em volta, não viu ninguém. Procurou rápido nos bolsos algo que pudesse esvaziá-la.
E se deixaria posta ali, do outro lado da porta. Tentou. Do seu corpo saía um líquido igual ao que vira: incolor, salgado, sem cheiro.
O relógio dali derretia. As horas caíam.
Ainda pensou: - seu corpo todo chorou e o meu também. Já não me importa se o tempo abisma.
Antes da inércia virou os olhos para dentro e viu que a polpa sangrava.
Concluiu que a alma tem cor. Sob a pele é que tudo habita e secreta.
Os líquidos secaram. A porta não fechara. A alma tem cor. O corpo não sangrara.
Aquele não era ele. Essa não era ela.
Lupiscínica, sussurrava: " mate-me que eu já te matei ".
Foto: interior da mansão Nilo Pereira, Ceará Mirim.
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