domingo, 29 de dezembro de 2013

O velho catador de lixo

Augusto Coelho Leal
Engenheiro

Estava sentado no alpendre de minha casa, olhando o mar e o nascer do sol, sentido a orquestra tocando a canção da vida, com os acordes do vento, das ondas do mar, o abanar das folhas dos coqueiros. Quando procurava conversar com Deus, lembrando que este ano perdi a convivência material de muitos amigos, espiritualmente eles continuam comigo. Como estarão suas famílias, nesta época de festas – Natal e Ano Novo- muitas, acho consoladas com a Paz de Cristo, outras talvez não. Senti uma tristeza, mas procurei entender os passos da vida, todos nós seguiremos o mesmo caminho.

Um pouco distante, vejo um senhor velhinho,já com a sua coluna vertebral se curvando, fazendo com que a sua aparência seja de uma pessoa que sempre olha para o chão e com passos lentos revirando o lixo, procurando ali o seu sustendo e provavelmente dos seus dependentes. Lembrei-me que aquele cidadão que é brasileiro igual a mim, faz este triste percurso há mais de trinta e oito anos e nada ou quase nada foi feito neste lugar para que as pessoas melhorem sua posição social, para que se viva com um pouco mais de dignidade, que já é hora para os políticos tomarem vergonha na cara e parar de ser hipócritas, para que pelo menos as crianças que nasceram nas próximas décadas não vejam cenas tristes como eu estou vendo.

O velho homem passa por mim lento e triste, em um esforço físico procura levantar o rosto e me dar bom dia,  para minha surpresa deseja-me Feliz Natal. Olhei para a minha consciência, os olhos lacrimejaram. Como eu que venho há trinta e oito anos neste local, nunca dei um grito de alerta para que me poupassem daquela cena, ao contrário, sempre assisti calado. Eu uma pessoa que tive bem mais oportunidades na vida, eu uma pessoa que pude estudar, não fiz nada e como a maioria dos veranistas da Praia de Cotovelo, não fez nada por aquelas pessoas que tanto poderiam ter sido ajudada por nós. Erramos sim, só olhamos do portão das nossas casas para dentro, até para o lado, não olhamos, para dar um alô ao o vizinho. É difícil, esta é a nossa sociedade consumista, “venha a nós o vosso reino.” Vivemos em uma sociedade, que pensamos em ter um super carro, sem termos uma boa casa, que temos uma boa casa, mas vendemos para comprar uma em um condomínio de luxo, pois lá estão as pessoas ditas ricas. Não vamos aos hospitais fazer um pouco de caridade, não passamos nos bairros humildes para levarmos um cobertor aos que não tem roupas, não levamos uma ceia para os que mendigam nas ruas, para os que tem fome, e ainda falamos que somos Cristãos.

De longe no imaginário ouvi uma valsa que minha tia Cristina tocava muito em seu piano na casa de meu avô, Fascinação – Os sonhos mais lindos sonhei /De quimeras mil/Um castelo ergui. Pensei comigo, quais foram ou são os sonhos deste velho homem, quais são os seus castelos? Será que foi ou é justo ele ter passado a sua vida assim? Não sei, talvez se Charlie Chaplin tivesse visto este senhor e esta cena, ele fosse um dos seus personagens nas suas tristes comédias. Embora tenha aprendido cantando: “Que na vida a gente tem que entender que um nasce pra sofrer, enquanto o outro ri,” não me sentia confortável, para mim era triste.

Mas o ato daquele simples homem mostrou-me que podemos viver cordialmente, aprender que ao passar por outro devemos pelo menos dar um bom dia, uma boa noite, de sentir a dor alheia, de falar com Deus e pedir perdão das nossas omissões, dos nossos pecados, de procurar amar o próximo. Que mesmo tendo as adversidades da vida é possível olhar para o seu semelhante e desejar pelo menos um Feliz Natal.

“Este ano quero paz no meu coração, quem quiser ser meu amigo, me dê à mão.” Vamos fazer um novo ano mais caridoso, vamos compartilhar amor e amizade, vamos procurar amenizar a dor dos mais carentes, vamos procurar valorizar a família, vamos não só ir aos cinemas, teatros, boates, restaurantes caros, vamos também aos hospitais, as casas de caridades, aos lares mais carentes. Esses são meus desejos de um Feliz Ano Novo.

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