domingo, 19 de agosto de 2012

O QUE SE OUVE (E SE VÊ) NA PERIFERIA

Públio José – jornalista
(publiojose@gmail.com)                              

Um dos pontos altos do trabalho que estamos desenvolvendo há mais de dez meses em contato com as mais diversas comunidades de Natal é a percepção da importância da valorização da vida comunitária. Com isso queremos dizer que é extremamente importante fazer as pessoas se orgulharem, se sentirem bem na região onde habitam. Para atingir esse patamar de satisfação logicamente são necessários vários fatores, entre os quais o nível de qualidade da prestação dos serviços públicos. E atualmente são extremamente precários os serviços prestados pelo poder público nas comunidades, principalmente nas mais distantes, as das áreas ditas periféricas. Essa realidade leva as pessoas a serem tomadas de um baixo nível de auto-estima, até de um acentuado complexo de inferioridade, o que ocasiona uma inversão na escala de valores e um certo desdém com a região onde moram.                                  
De antemão, queremos deixar bem claro que não vai aqui nenhuma paulada gratuita nas autoridades estaduais e municipais. Não estamos no terreno político somente para apontar defeitos, mas – e principalmente – para sugerir soluções. De fato, sem a valorização da vida comunitária, fica difícil imaginar um contexto geral de progresso social para toda uma cidade – quando a grande maioria se sente desprezada, marginalizada e com um nível de vida bem abaixo do razoável. O que poucos sabem é que, apesar disso tudo, as pessoas dos bairros mais distantes são extremamente saudáveis no sentido de almejarem uma vida melhor. Elas vibram com qualquer movimentação que as tire do marasmo, que as faça sonhar com algo novo, que as motive para seguirem em frente. A perspectiva de um projeto novo, a antevisão de uma nova realidade contagia rapidamente este contingente populacional. Entretanto, quando olham ao seu redor...                                      
Pelo nível de insatisfação que toma conta de populações inteiras da periferia já dá para concluir que um novo modelo precisa ser implementado. Se faz necessário um pensar diferente, acompanhado de um planejamento que tenha por objetivo contemplar essas pessoas com uma nova perspectiva de vida e um patamar aprimorado de prestação de serviços. Uma dimensão, enfim, que gere uma nova visão de desenvolvimento social que contemple a todos – ou pelo menos a grande maioria.  O modelo pelo qual a elite determina o que deve ser levado aos bairros mais afastados está esgotado. Por mais distantes que essas pessoas estejam do saber, da informação, a vida globalizada dota-as – através dos veículos de comunicação – de um mínimo de conhecimento que as faz a cada dia mais conscientizadas e, em conseqüência, mais exigentes.                                     
Na periferia, atualmente, os grupos de discussão se tornam mais freqüentes. Embora nas elites haja uma noção – na realidade falsa – de alheamento, de desconexão dessas pessoas com os problemas do bairro, o nível de envolvimento, de preocupação com os senões da vida comunitária aumenta a cada dia, paradoxalmente acompanhado de um profundo sentimento de pesar, de decepção com a realidade vigente. Muito mais por promessas formuladas, e não cumpridas, do que propriamente pela potencialidade da região onde fincaram suas raízes. Assim, ao lado de fortes sentimentos de frustração caminham, embora opostos, latentes desejos de mudança – e uma comovedora espera por amplas transformações. Resta ao governante sábio detectar essa sensação coletiva por uma nova realidade e construí-la sem delongas. Ou continuar a fazer-se medíocre na aplicação de modelo já ultrapassado. Que tal ouvir a periferia?

Nenhum comentário:

Postar um comentário