quarta-feira, 30 de março de 2011

Passeio de domingo

Paulo Correia
Jornalista
paulo.correia@r7.com
Resolveu que esse domingo ia ser diferente. Nada de churrasco com os amigos e a família. Muito menos Faustão e Gugu no final de tarde na TV. Queria fazer um passeio diferente, fora do seu comum nesses domingos repetitivos e que só o empurram para a segunda-feira. Resolveu que daria uma volta completa no centro de Natal. Resolveu que iria visitar o Beco da Lama e as ruelas da histórica Cidade Alta.
Comunicou aos filhos e a esposa que ia de ônibus e perguntou se alguém iria acompanhá-lo, mas já sabia a resposta de todos: Um sonoro não. Tudo bem, é até melhor assim. Sem aborrecimentos ou pedidos para voltar para casa. Sozinho ele iria observar melhor os espaços e ruas que já foram do seu passado, quando morava naquele bairro e vivia intensamente toda a agitação daquele beco e dos personagens que por ali passaram. Tempo que foi sendo substituído quando casou e teve que sair da casa dos velhos para fixar residência em Ponta Negra, então um bairro novinho em folha e com vizinhos ainda desconhecidos. Não nega que foi um tempo maravilhoso. Feliz com a esposa e com os filhos que iam chegando.
Mas de volta ao passeio. Saiu de casa disposto a rodar todo o centro histórico de Natal e parar com cuidado em todos os pontos e endereços de sua infância e adolescência. Tempos em que a Cidade Alta ainda era a artéria principal da cidade. Uma época em que não existiam os refrigerados shoppings e nem essa violência e trânsito louco de hoje em dia.
Desceu do ônibus na Avenida Rio Branco, ali pertinho da subida do Baldo. Já foi observando o imponente prédio do IFRN, antiga Escola Industrial. Um espaço que merecia aquela reforma e que ganhou novos ares de beleza. Seguiu em frente. Depois foi a igreja do Galo, passou na rua lateral e lembrou-se de boas festas que começavam por ali, naquela bucólica ruazinha. Viu dois bêbados abraçados e cantando alto passando lá na frente, com destino ao famoso Bar do Coelho. Esse deveria estar fechado naquele começo de manhã. Lembrou de farras que também acabavam a essa hora e dos esporos da mãe quando chegava em casa com os movimentos que todo bebum possui.   Riu sozinho.
Passou pela Praça André de Albuquerque. Viu alguns garotos deitados nos bancos fumando maconha sem se preocuparem com nada. Seguiu seu caminho. Foi depois até ao famoso Beco da Lama. Ali viu que Natal esqueceu o seu centro. Viu que a cidade e a sua população se mudaram para outros bairros. Viu que o antigo centro somente respira nas lojas comerciais. Observou que o brilho do passado somente existe na imaginação de poucos. Sentiu uma melancolia com esse pensamento.
A solidão daquelas ruas na manhã de domingo o atingiram de vez. Será que nada poderia ser feito pelo centro?
Voltou para casa e de tarde foi com a esposa e os filhos para o shopping. Observou toda aquela gente nos corredores e nas filas do cinema. Viu que o centro agora é ali, naquela imensa caixa refrigerada e com pipoca tamanho gigante. Teve vontade de chorar. Lembrou dos alegres bêbados da Cidade Alta que vira de manhã.
Os tempos agora são outros. Tempos de comportados homens e mulheres que vivem de ilusões mercadológicas.
Tempos que não absorvem aquela felicidade espontânea do centro histórico.

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