segunda-feira, 18 de abril de 2011

Leitura que deixa saudade


Leonardo Sodré
Jornalista

Na tarde deste domingo chuvoso terminei com tristeza de ler as últimas páginas da biografia de Nelson Rodrigues, escrita pelo genial Ruy Castro, de forma romanceada: “O Anjo Pornográfico”. Um presente de minha irmã, Simone, no final de ano. Fui lendo pelas beiradas, como quem come uma deliciosa papa bem quente. Fui devagar aprendendo com aquele texto mágico do “expert” em biografias.

Conhecer Nelson Rodrigues, seus textos, seu pai, sua mãe, seus irmãos e irmãs, sua luta pela vida e por conseguir emplacar suas peças num País hipocritamente beato, sua luta pela sobrevivência, passando por várias redações de jornais, seu amor e desamor pelos amigos, seus amores, sua tinta nada impessoal nas suas colunas, como “A vida como ela é”, “Suzana Flag” e “Confissões”, tudo isso de forma romanceada por Ruy Castro, não é para ser lido afobadamente. Tem que ser lido devagar, vivendo cada momento.

Ah! Tem uma passagem no livro que trata do esforço do irmão de Nelson, Mário Filho, para conseguir terminar a construção do Estádio Maracanã, para a Copa do Mundo de 1950, que terminou por receber o nome de Estádio Municipal Mário Filho, com justiça, que não deve ser lida por essa turma daqui que está cuidando dos preparativos para a Copa do Mundo de 2014. Lá para as tantas existe a informação de que o Maracanã somente ficou pronto faltando algumas horas para a abertura do evento.

Já pensou a contagem regressiva se isso acontecesse por aqui?

Uns, os sempre otimistas iriam dizer: “sem problemas, tudo vai dar certo”, diante de um pedaço faltante da Arena das Dunas. Outros, os pessimistas: “Eu bem que avisei, não quiseram me escutar. Está vendo? Faltou dinheiro...”

Aliás, sobre a Copa do Mundo de 2014 em Natal, vejo nos que a defende uma determinação clássica de que a cidade irá se adiantar no tempo em pelo menos trinta anos, ou mais. Vejo alguns políticos defenderem até com certo ardor essa questão. Vejo empresários, burocratas (ah! Os burocratas defendem com convicção), alguns intelectuais, jornalistas... Mas não vejo brilho nos olhos dos que defendem. Parece uma coisa mecânica, como se não tivessem certeza diante da magnitude das obras que terão que vir.

É como ver um bando de torcedores do Flamengo, em pleno Fla X Flu, ganhando por um a zero e vendo o time perder goles sem esboçar nenhuma reação. Os que defendem a Copa de 2014 em Natal a defendem, sem dúvida, mas sem nenhuma emoção embora os seus discursos estejam na ponta da língua. Mas, nem escrito nas manchetes diárias eles conseguem passar tal convicção.

Provavelmente Nelson Rodrigues faria um estudo profundo dessa apatia diante da perspectiva da maior obra da História de Natal, a Arena das Dunas. Quem sabe em um texto ele analisasse essa falta de amor do marido retórico pela noiva que ninguém sabe se vai conseguir sobreviver ou se o tempo deixará nascer. Se for o caso, para delírio do noivo que não consegue vê-la viva, que chegue, assim como o Maracanã, a poucas horas do primeiro jogo.

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