quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

O Reveillon

Tasso Soares de Lima

Na verdade, das festas de fim de ano, esta é a que exige mais cuidado e preparação. Não é só ir para festa. Não. Tem que se preparar, seguir o ritual necessário para uma boa passagem de ano. Tem aquela história dos sete caroços de romã, pular sete ondas após a meia noite. E, por fim, você tem que fazer a passagem de branco. Ou, pelo menos, ter uma peça branca. Certa ocasião, a minha mulher perguntou se eu tinha comprado a roupa do Ano Novo. Como todo daltônico que se preza mostrei uma bermuda azul e uma camisa amarela. Quando ela viu, quase teve um ataque:
__Você vai de bermuda roxa e uma camisa verde cana?? Falta só o tênis ser marrom. Eu ainda ensaiei contestar, afirmando que o tênis não era marrom e sim preto desbotado. Mas o meu histórico de daltônico não me era muito favorável. O tênis realmente era marrom.
__E agora? Você não pode romper o ano com cores desfavoráveis__ gritou minha mulher, preocupada com o possível atraso para ir à festa. Perguntei:
__Se é assim, quais são as cores favoráveis?
__Você tem que usar uma peça branca, para trazer paz, amor e ter um ano seguinte próspero.__respondeu ela, já esbaforida.
__Mas isso é superstição. Não acredito nisso não __ falei como a maioria dos homens que dizem não ter superstição, mas num passa por baixo de uma escada nem pau.
__Nada disso. Eu não vou passar o ano com um homem azarado. Lembra de Arnóbio, casado com minha prima Estere (o pai botou o nome na filha de Estereofônica, porque viu numa radiola).Pois, ele foi para o reveillon de marrom. No mês seguinte foi preso pela Receita Federal por sonegação __ respondeu, já ficando desesperada
__Mas o que faltou a ele foi pagar os impostos, e não uma roupa branca __ respondi com o meu direito a tréplica.
__Nada disso. E o Tio Nenzinho que quando se separou da mulher, ela levou tudo que ele tinha, só porque fez a passagem do ano de vermelho __ respondeu resoluta.
__Mas aí faltou um bom advogado e não roupa branca. Se fosse assim, Papai Noel despencava do trenó todo ano, pois ele não só passa o reveillon de vermelho, como também o ano todo __ respondi.
__Não seja engraçadinho. Ele deve trocar de roupa, que num é besta. E o Alfredinho, que virou gay no ano seguinte, porque rompeu o ano de cor-de-rosa __falou, já chateada.
Aí eu descobri que ela não só acreditava em superstição, como também em Papai Noel. Mas, para não “encumpridar” a conversa, resolvi ceder.
__Vou vestir então aquela camisa branca do casamento.
__O quê?? Nem pensar! Primeiro porque aquela camisa num lhe cabe mais. Naquela época você tinha 64 quilos, e hoje você é o terror das balanças. Além do mais, ela tem uns vinte anos. Depois, tem que ser uma roupa branca nova, que ainda não foi usada __ sentenciou ela.
E agora, o que fazer? São 23h, num tem loja, shopping e nem supermercado aberto a essa hora. Estaria eu fadado a ser preso pela Receita Federal, perder todos os meus bens, que por sinal já não são muitos, e virar gay? Prá num arriscar, resolvi tentar encontrar uma solução. Deixando claro que eu não sou supersticioso, mas os argumentos eram muito fortes.
Saímos desesperados procurando algum estabelecimento aberto. O único que encontramos foi uma farmácia de plantão, que, lógico, não vendia roupa branca. A solução foi drástica e dramática, para mim, claro: passei o reveillon de fralda da Turma da Mônica, sem poder beber nem água, para evitar ir ao banheiro. Já imaginou ter que pedir algum colega de sanitário para prender o broche na minha fralda.

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